Os consumidores estão mais críticos e procuram consumir produtos e aditivos de origem natural aos de origem sintética, que podem estar relacionados a malefícios à saúde. O corante natural vermelho carmim encontra-se em diversos alimentos substituindo corantes sintéticos vermelhos. Ele é uma alternativa isenta de riscos?
Introdução:
É sabido que
muitos corantes sintéticos causam malefícios à saúde. Suas estruturas químicas,
geralmente derivadas do petróleo, já se mostraram genotóxicas e também
associadas a malefícios mais imediatos e perceptíveis, como rinite e asma.
Nesse
contexto, os corantes naturais surgem como uma alternativa aparentemente menos
tóxica para o consumidor, que está mais exigente e busca opções mais saudáveis
ou com ingredientes que apresentem a ideia de “natural”.
Vários alimentos
industrializados utilizam corantes naturais em sua formulação, tais como o
empanado de carne de frango Seara® – turma da Mônica, Sorvete Napolitano
Especialidades da Nestlé® e néctar de goiaba Tial® Kids, para citar apenas
alguns exemplos.
Os mais utilizados
na indústria alimentícia hoje em dia são os extratos de urucum, carmim de
cochonilha, curcumina, antocianinas e as betalaínas. Mas será que de fato há uma redução dos riscos ao se optar pelo
uso desses corantes?
Legislação:
A Resolução da Comissão Nacional de Normas
e Padrões para Alimentos, do Ministério da Saúde, estabeleceu em 1997 as
condições gerais de uso de corantes alimentícios em alimentos e bebidas (Resolução - CNNPA nº 44, de 1977).
Nela, considera-se corante a substância ou a mistura de
substâncias que possuem a propriedade de conferir ou intensificar a coloração,
excluindo-se sucos e/ou os extratos de vegetais e outros ingredientes
utilizados na elaboração de alimentos que possuem coloração própria, salvo se
adicionados com a finalidade de conferir ou intensificar a coloração própria do
produto.
Reconhece e classifica os corantes de acordo com sua origem,
sendo corante orgânico natural aquele obtido a partir de vegetal ou de animal;
e corante orgânico sintético aquele obtido por síntese orgânica, sendo
subdividido ainda em artificiais (quando não é encontrado na natureza) e
idêntico ao natural (cuja estrutura química é semelhante à do princípio ativo
isolado de corante orgânico natural). Também há os corantes inorgânicos e caramelo
(obtido do aquecimento do açúcar, sendo natural, ou obtido por processamento da
amônia, sendo sintético idêntico ao natural).
Dentre os naturais, os autorizados para uso em alimentos e
bebidas são: curcumina, riboflavina, urzela, clorofila, caramelo, carvão
medicinal, caratenóides, xantofilas, vermelho de beterraba e antocianinas.
A RDC nº44 de 09/08/2012 também permite o uso do corante
vermelho carmim em produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes para
qualquer região do corpo.
Aspectos Bromatológicos:
O
corante natural vermelho carmim (E120) é de origem animal obtido a partir de
fêmeas dessecadas de insetos da espécie Dactylopius
coccus. O termo carmin, ou também laca de alumínio, são usados para
descrever o complexo formado a partir do alumínio e do ácido carmínico, sendo
esta última a substância extraída do inseto.
O
ácido carmínico é um composto orgânico derivado da antraquinona,
especificamente uma hidroxiantraquinona ligada a uma unidade de glicose, cuja
estereoquímica foi recentemente definida. Sua nomenclatura oficial é ácido
7-D-glucopiranosil-7-D-glucopiranosil-9,10-dihidroxi-3,5,6,8-tetrahidroxi-1-metil-9,10-dioxi-2-antraceno-carboxílico.
Em pH ácido adquire a cor laranja, tornando-se vermelho na faixa de 5,0 a 7,0 e
azul na região alcalina.
É
o principal constituinte do extrato e responsável pela cor, sendo considerado
de uso seguro para uso em alimentos. As lacas de alumínio são solúveis em água
e a sua coloração varia menos com o pH do meio (em pH 4 é vermelha e em pH 10
muda para azul). Também se mostra bastante estável ao calor e à luz, resistente
a oxidação e não sofre alterações significativas pela ação do dióxido de
enxofre. Portanto, do ponto de vista tecnológico, possui boas características e
é encontrado em conservas, gelatinas, sorvetes, produtos lácteos e sobremesas
diversas.
Discussão:
O
corante vermelho carmim (E120) e outros corantes agem como alérgenos ocultos e
podem ser responsáveis pela anafilaxia idiopática ou recorrente em alguns
casos.
A
capacidade do corante carmim para induzir uma resposta imune foi investigada
pela primeira vez em 1994 por Quirce et al. Os autores encontraram IgG
específica em 10 trabalhadores que haviam sido expostos ao corante, onde 3 deles
tinham rinite ou asma.
Reações
mais severas como anafilaxia mediada por IgE após ingestão desse corante também
já foi observada: o caso de uma mulher de 52 anos de dezembro de 2013 a abril
de 2014 que não tinha histórico de alergia ou urticária. O primeiro episódio
ocorreu após o consumo de uma bebida vermelha, em que a paciente apresentou rubor
generalizado, angioedema da face e cefaleia, que foram resolvidos com
glicocorticoide oral e anti-histamínico. No segundo episódio, houve dor
abdominal, diarreia, eritema generalizado e perda de consciência logo após o
jantar, precisando de adrenalina intramuscular, anti-histamínico e glicocorticoide
por via intravenosa. Foram feitos exames cutâneos para investigar a alergia, bem
como exames de imunodiagnóstico. Todos os testes cutâneos tiveram resultados
negativos, exceto o teste cutâneo com o suco de frutas (que continha o corante
vermelho carmim) e a dosagem de IgE específica para esse mesmo corante.
Não só pela
ingestão é possível desenvolver problemas de saúde: já houve relatos de doenças
respiratórias ocupacionais, tais como rinoconjutivite e asma, em trabalhadores
de fábricas que produzem corantes naturais. Há também a sugestão de que o
contato tópico com o corante através de cosméticos explique o fato de que a
anafilaxia causada por esse corante ocorra quase que exclusivamente em
mulheres.
Logo, não é só
por ser um corante de origem natural que é isento de riscos à saúde do
consumidor. Aos alérgicos, é necessário sempre observar no rótulo se o produto
contém corante artificial natural vermelho carmim antes de consumi-lo. A todos
os outros consumidores, é indicado procurar ajuda médica em caso de algum sinal
ou sintoma que possa estar relacionado ao uso de corantes.
Bibliografia:
BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Comissão Nacional de Normas
e Padrões para Alimentos nº 44, 25/11/1977. Dispõe sobre as estabelecer as condições gerais de elaboração, classificação, apresentação, designação, composição e fatores essenciais de qualidade dos corantes empregados na produção de alimentos (e bebidas).
BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada nº 44, 09/08/2012. Aprova o Regulamento Técnico
Mercosul sobre “Lista de substâncias
corantes permitidas para produtos de
higiene pessoal, cosméticos e
perfumes” e dá outras providências.
De Pasquale, T. et al. Recurrent
Anaphylaxis: A Case of IgE-Mediated Allergy to Carmine Red (E120). J Investig Allergol Clin Immunol, vol
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GREENHAWT,
M. J, e BALDWIN, J. L. Carmine dye and cochineal extract: hidden allergens no
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LOCATELLI, K. Detecção da Genotoxicidade dos corantes artificiais Amarelo Tartrazina
e Vermelho 40 pelo teste SMART de asa em Drosophila
melanogaster. 28/02/2008. 33. Tese – Universidade Federal de
Uberlândia. Uberlândia, 2008.
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