Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

sábado, 6 de agosto de 2016




CABELO DA RAPUNZEL COM NUTRACÊUTICOS?




  



      Descrição
São produtos que apresentam em sua composição vitaminas e minerais, se auto-denominam como nutracêuticos e afirmam não possuir contra-indicação para pessoas saudáveis, excluindo gestantes, nutrizes e crianças de até 3 anos de idade. Prometem com seu uso alguns benefícios como fortalecimento e crescimento capilar, além de combate à queda de cabelos. Apresentam em sua composição: vitamina B6, biotina, cromo, selênio e zinco. Alguns produtos também podem apresentar componentes como magnésio, ácido fólico, vitamina PP, vitamina C, vitaminas B1 e B2, vitamina E, vitamina B12, silício e ácido pantotênico.
Outro fator bastante mencionado em folhetos explicativos ou bulas desses produtos é que os mesmos são isentos de registro pela ANVISA, de acordo com a Resolução RDC 27/2010.

Fundamentos Bromatológicos
É sabido que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) recomenda valores diários para ingestão de determinados componentes. A tabela a seguir foi retirada do portal da ANVISA:

                                                                   Tabela 1: Ingestão Diária Recomendada para adultos

                                                      Fonte: portal.anvisa.gov.br
Os valores de ingestão devem ser atingidos através de tudo que é consumido no dia por um indivíduo adulto saudável (sem doença prévia ou gestação).  Dessa forma, somam-se os alimentos, os suplementos e bebidas ingeridos em um dia.
Comprovações da relação entre consumo de vitaminas e minerais e crescimento e aumento de força e resistência de cabelos vêm sendo muito procuradas no meio científico. Além disso, especialistas tendem a descobrir as causas dos problemas de queda e falta de crescimento capilar previamente, para assim, definir melhores planos de ação para solucioná-los, pois se sabe que nessas causas há a possibilidade de fatores genéticos e/ou hormonais e/ou nutricionais estarem envolvidos.
Os componentes mais frequentes nos produtos observados estão a seguir com suas principais ações conhecidas de forma bem resumida:
Piridoxina: Participa do metabolismo de aminoácidos, evita alguns tipos de anemia (que pode ser causa de queda de cabelo). Além disso, a vitamina B6 atua na síntese de alguns neurotransmissores que poderiam aliviar quadros de stress (associados à queda de cabelo).
Biotina: Outra substância que faz parte do complexo B, a biotina também é conhecida como  vitamina B7. Acredita-se que ela ajude na formação da estrutura da queratina (proteína que compõe os cabelos e as unhas). Além das fontes de biotina disponíveis na nossa alimentação (como gema de ovo, amendoins, carnes, vegetais de folha escura), as bactérias que formam a flora intestinal também produzem biotina.
Cromo: Importante para a atividade da insulina no organismo e participa do processamento das gorduras no corpo, interferindo nos níveis de colesterol e triglicerídeos. O excesso de cromo pode provocar queda de cabelo.
Selênio: O selênio é importante para o funcionamento da tireoide, além de participar da atividade de algumas enzimas e ter efeito antioxidante. A falta de selênio no organismo pode provocar queda de cabelo, além de enfraquecimento das unhas, cansaço, dores musculares e problemas de pele. Porém o excesso de selênio (também chamado de selenose) também pode causar queda de cabelo.
Zinco:  Fundamental para o sistema imunológico e auxilia na cicatrização dos tecidos. 

 Legislação Vigente
RDC n°27 de 06 de agosto de 2010 é citada nos produtos do estudo como modo de afirmar que esses produtos são isentos de registro sanitário por serem suplementos vitamínicos e/ou minerais. Alguns anexos dessa RDC são mostrados a seguir:

Fonte: portal.anvisa.gov.br
Fonte: portal.anvisa.gov.br

Como visto no anexo II, alimentos com alegações terapêuticas necessitam de registro sanitário. Os alimentos com alegações de propriedades funcionais e ou de saúde são definidos como e/ou relacionados a:
‘’Representações que afirmem ou sugiram a existência de uma relação entre o consumo de determinado alimento ou seu constituinte e a saúde podem ser veiculadas quando forem atendidas as diretrizes básicas para comprovação de propriedades funcionais ou de saúde estabelecidas na Resolução n. 18, de 30 de abril de 1999. Além da segurança do alimento, essas diretrizes visam que as alegações sejam comprovadas cientificamente e não induzam o consumidor ao engano. As alegações podem descrever o papel fisiológico do nutriente ou não nutriente no crescimento, desenvolvimento e nas funções normais do organismo. ’’
Para suplementos vitamínicos e minerais, o uso de alegações plenamente reconhecidas, previsto na Portaria SVS/MS n. 32, de 13 de janeiro de 1998, também está sujeito à avaliação da ANVISA. Assim, as empresas que desejarem utilizar alegações na rotulagem de suplementos vitamínicos ou minerais, embora essa categoria seja isenta da obrigatoriedade de registro, devem solicitar a autorização para uso da Alegação de Propriedades Funcional e ou de Saúde.
E a Portaria SVS/MS n. 32, de 13 de janeiro de 1998 possui como tópicos:
a)     normalizar o uso de Suplementos Vitamínicos e ou Minerais no País
b)    controlar efetivamente sua produção e/ou comercialização:
d)    - que os nutrientes destinados a complementar uma dieta normal devem ser reconhecidos como alimento, e não como alimentos para fins especiais;
- que aos Suplementos Vitamínicos e ou Minerais não podem ser apregoados indicações terapêuticas;
Análise e discussão
Fonte: Folheto explicativo do produto 


Tabela 2: Composição Exímia Fortalize
Fonte: Embalagem do próprio produto

 Segundo as composições fornecidas por alguns produtos observados, como visto acima, percebe-se que alguns desses componentes estão presentes acima das recomendações diárias da ANVISA como a biotina, por exemplo. Em outros casos, as quantidades presentes estão muito próximas daquelas recomendadas para 1 dia, o que pode acarretar um excesso desses componentes ao levar em conta a obtenção desses mesmos componentes na própria alimentação do indivíduo. Aqui podemos citar a vitamina A, vitamina B6, vitamina E, vitamina B12, zinco, dentre outros. Dessa forma, se o indivíduo não apresentar carência desses nutrientes e utilizar um suplemento vitamínico/mineral de venda livre, pode apresentar danos à saúde.
Além disso, ainda não há dados na literatura científica que concluem que apenas vitaminas e minerais podem fazer, de fato, o cabelo crescer ou torná-lo mais forte e resistente. O que vêm sendo discutido são os hábitos alimentares das pessoas que apresentam problemas de queda ou falta de crescimento dos cabelos; assim como as causas do problema, podendo ser de fundo genético e/ou hormonal e/ou nutricional, dentre outras. Se a causa da queda ou falta de crescimento do cabelo não for uma carência nutricional, os suplementos observados não serão úteis para cessar o problema.
A maioria dos produtos observados não divulgou estudos onde foram confirmadas as alegações terapêuticas presentes nos rótulos. Aqueles produtos, que indicaram a presença de estudos, não especificaram as condições que esses foram realizados, assim como tamanho das amostras, dados omitidos em folheto explicativo que podem enviesar esses estudos.
Outro fator a ser discutido é a alegação terapêutica (combate à queda, auxilia em crescimento capilar, dentre outras) que vem sendo realizada por esses produtos mesmo sem possuir registro sanitário e apresentar comprovação científica para tal. Dessa forma, o consumidor pode ser induzido ao erro.

Conclusão
Pode-se concluir que os produtos em estudo são comercializados sem registro segundo à RDC n° 27 de 06 de agosto de 2010, porém colocam em sua rotulagem e embalagem indicações terapêuticas específicas como queda de cabelo e fraco crescimento do mesmo. Dessa forma, trata-se de suplementos vitamínicos e minerais associados a efeitos terapêuticos, o que não é permitido pela Portaria SVS/MS n°32, de 13 de janeiro de 1998.
Além de não haver dados da literatura para assegurar o crescimento de cabelo prometido pelos produtos, os laboratórios produtores não apresentaram dados conclusivos sobre o assunto de modo público.
Portanto, pessoas saudáveis, sem qualquer tipo de carência nutricional diagnosticada, devem procurar um farmacêutico ou médico para avaliação prévia do consumo desses produtos.
 Referências
1.    Verdades e mitos- Imecap Hair, <disponível em> http://www.chegadequeda.com.br/imecap-hair/
2.    Resenha Imecap Hair, <disponível em> http://www.bulafashion.com/2014/09/resenha-imecap-hair.html
3.    RDCs citadas <disponíveis em> http://portal.anvisa.gov.br/
4.    Vitaminas e minerais <disponível em> http://www.assis.unesp.br/Home/Servicos/UNAMOS/PALESTRA_VITAMINAS_E_MINERAIS.pdf
5.    Regulamento técnico sobre ingestão diária recomendada para proteína, vitaminas e minerais. Disponível em <http://www4.anvisa.gov.br/base/visadoc/CP/CP%5B8989-1-0%5D.PDF>
6.    Disponível em < https://consultaremedios.com.br/eximia-fortalize/p>
7.    Disponível em < ultrafarma.com.br>



 


2 comentários:

  1. Leticia Conceição de França11 de setembro de 2016 às 16:16

    A suplementação de vitaminas deve ser restrita a casos específicos, pois na maioria das vezes uma alimentação equilibrada e saudável já é suficiente para suprir todas as necessidades de vitaminas e minerais do organismo. Além disso, uso excessivo de vitaminas pode ser prejudicial a saúde, resultando em um quadro denominado hipervitaminose. A vitamina A, por exemplo, quando consumida dentro das doses diárias recomendadas (até 600 mcg ER), está envolvida na regulação e na promoção do crescimento e na diferenciação celular e na manutenção da integridade do tecido respiratório e células epiteliais. Também desempenha papel importante em funções reprodutivas, e efeitos benéficos para a visão. Por outro lado, quando consumida em excesso, pode levar a náusea, icterícia, irritabilidade, anorexia, vômitos, visão turva, cefaleia, dor muscular e abdominal, fraqueza, sonolência, dano renal, alterações do estado mental e perda de cabelo, efeito oposto ao que se espera pelo tratamento com esses produtos. Considerando que o individuo faça suplementação com 600 mcg ER (quantidade presente no produto Exímia Fortalize) sem indicação e acompanhamento médico, e além disso tenha uma dieta rica em alimentos contendo vitamina A (fígado, leite, ovos, óleo de peixe, vegetais folhosos verde-escuros, entre outros), a probabilidade de apresentar um quadro de hipervitaminose com uso contínuo torna-se aumentada. Portanto a suplementação de vitaminas e minerais sempre deve ser feita através de orientação médica, avaliando-se a necessidade, riscos e possíveis interações medicamentosas.

    Referências:
    LEMOS JÚNIOR, H. P.; LEMOS, A. L. A. Vitamina A. Diagn Tratamento, 15(3): 122-4, 2010.
    HARVEY, R. A. Bioquimica ilustrada. Porto Alegre: Artmed, 2012. p. 384.

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  2. É importante ressaltar que os três medicamentos citados no estudo são conhecidos como OTC ("over the counter") e, por isso, possuem regras diferenciadas quanto as exigências científicas pedidas pela ANVISA, conforme as RDCs 98/16 e 242/18, além da NI 11/16.
    Fora isso, não é incomum que os estudos regulatórios sejam tratados como Data on file - isto é, de utilização apenas interna da indústria comercializadora dos produtos. Com isso, acredito que seja arriscado afirmar que os produtos não possuam estudos comprovando os claims de marketing.
    Um dos produtos exemplificados no texto, Exímia Fortalize Kera D, possuia 4 estudos clínicos publicados na época em que a publicação foi feita e, desde então, teve mais três estudos publicados (Addor, 2018 A, B e C).
    De maneira geral, todo produto veiculado em prateleiras de farmácias passou pelo crivo regulatório da Anvisa e todas as alegações precisam ser provadas. A indisponibilidade das referências utilizadas não significa que elas não existem - apenas que não são de domínio público.

    Referências:

    ADDOR, Flávia Alvim Sant’Anna; DONATO, Ludmila Coelho; MELO, Camila Sirieiro Abreu. Comparative evaluation between two nutritional supplements in the improvement of telogen effluvium. Clinical, cosmetic and investigational dermatology, v. 11, p. 431, 2018.
    ADDOR, Flávia Alvim Sant’Anna; MELO, Camila Sirieiro Abreu; VIEIRA, Juliana Cotta. The e?ects of an association of nutrients on human follicular dermal papilla: an in vitro study. Surg Cosmet Dermatol. Rio de Janeiro v.10 n.3 p.9-13, 2018.
    ADDOR, Flávia Alvim Sant’Anna; MELO, Camila Sirieiro Abreu; VIEIRA, Juliana Cotta. Efficacy of a nutrient association on hair cycle regulation and keratinogenesis: molecular basis. Surg Cosmet Dermatol. Rio de Janeiro v.10 n.3 p.14-18, 2018.
    ADDOR, Flavia Alvim S. Influência da suplementação de nutrientes no metabolismo dos queratinócitos: estudo in vitro. Surgical & Cosmetic Dermatology, v. 4, n. 2, p. 150-154, 2012.
    ADDOR, Flávia Alvim Sant'Anna et al. Fatores nutricionais e resistência da haste capilar: estudo clínico piloto. Surgical & Cosmetic Dermatology, v. 4, n. 1, p. 53-57, 2012.
    ADDOR, Flávia Alvim Sant’Anna et al. Influência da suplementação nutricional no tratamento do eflúvio telógeno: avaliação clínica e por fototricograma digital em 60 pacientes. Surgical & Cosmetic Dermatology, v. 6, n. 2, p. 131-136, 2014.
    ADDOR, Flávia Alvim Sant’Anna. Efeito de suplementação nutricional no fortalecimento e crescimento das lâminas ungueais. Surgical & Cosmetic Dermatology, v. 8, n. 4, p. 311-315, 2016.
    RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA – RDC N° 98, DE 1° DE AGOSTO DE 2016
    RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA RDC N° 242, DE 26 DE JULHO DE 2018
    INSTRUÇÃO NORMATIVA - IN Nº 11, DE 29 DE SETEMBRO DE 2016

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