Apresentação

Espaço para a apresentação e análise de estudos e pesquisas de alunos da UFRJ, resultantes da adoção do Método de Educação Tutorial, com o objetivo de difundir informações e orientações sobre Química, Toxicologia e Tecnologia de Alimentos.

O Blog também é parte das atividades do LabConsS - Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde, criado e operado pelo Grupo PET-SESu/Farmácia & Saúde Pública da UFRJ.Nesse contexto, quando se fala em Química e Tecnologia de Alimentos, se privilegia um olhar "Farmacêutico", um olhar "Sanitário", um olhar socialmente orientado e oriundo do universo do "Consumerismo e Saúde", em vez de apenas um reducionista Olhar Tecnológico.

segunda-feira, 11 de março de 2013

Beautybar® - beleza em formato de barras de cereais?!




A indústria de cosméticos é uma potência crescente no mundo atual, a busca pelo “rosto bonito e corpo perfeito” é incessante, ao ponto que as empresas de “alimentos” encontraram uma ótima vertente para ampliarem suas vendas. E é neste âmbito que o produto em questão - beautybar® - busca se estabelecer com o slogan de “Achar o tom, entrar no ritmo, curtir o momento, com beautybar® dá pra ser jovem todo dia”. O fabricante – beauty’in® - possui uma linha de produtos registrados por ele como Aliméticos® (Alimento + Cosmético), onde a abordagem do marketing direciona-se aos efeitos benéficos relacionados à estética a partir da ingestão destes produtos. A apelação utilizada para relacionar os fatos é “Faz bem por dentro e ainda cuida por fora.” Eis que surge a pergunta, será de fato que a ingestão destes produtos provoca um incremento à beleza? Leia mais...




Descrição do produto:

Analisando a informação nutricional do produto, pode-se aferir que se trata de um poli-vitamínico, do mesmo time do Centrum, e outros. No entanto, a frase dita pela proprietária da empresa, Cristiana Arcangeli, “Estou muito feliz em apresentar uma nova geração de produtos de beleza.” suscita a dúvida quanto a classificação desses produtos como alimentos ou cosméticos, a presença de uma tabela nutricional na embalagem acrescenta ainda mais incerteza a questão.
A descrição presente no site do fabricante do produto caracteriza-o da seguinte maneira: “São cubos de cereais orgânicos com vitaminas, colágeno e linhaça dourada. O inédito formato em cubos favorece uma alimentação mais equilibrada e nutritiva, e proporciona maior absorção dos nutrientes. Disponível em 4 versões, com 4 opções de sabores, todos acrescidos de vitaminas, fibras, colágeno, e isentos de gordura trans, conservantes, corantes artificiais e xarope de glicose.”

Fundamentos bromatológicos:

 Um alimento pode ser considerado funcional se for demonstrado que o mesmo pode afetar beneficamente uma ou mais funções alvo no corpo, além de possuir os adequados efeitos nutricionais, de maneira que seja tanto relevante para o bem-estar e a saúde quanto para a redução do risco de uma doença” (ROBERFROID, 2002); portanto pode-se sugerir que de acordo com as informações presentes no rótulo do produto em questão, este se trata de um alimento funcional.
No entanto, a falta de uma regulamentação mais rígida no que tange aos produtos conhecidos como suplementos nutricionais, que pela Portaria SVS n°32 de 13 de janeiro de 1998 são definidos como “alimentos que servem para contemplar com estes nutrientes a dieta diária de uma pessoa saudável, em casos onde sua ingestão a partir da alimentação, seja insuficiente ou quando a dieta requerer suplementação. Devem conter um mínimo de 25%, e no máximo até 100% da Ingestão Diária Recomendada (IDR) de vitaminas e ou minerais, na porção diária indicada pelo fabricante, não podendo substituir os alimentos, nem serem considerados como dieta exclusiva”; pode favorecer o fabricante, de modo que o produto possa ser explorado também como um suplemento nutricional, ampliando o escopo de vendas.
Portanto, a abordagem realizada deixa de levar em consideração a IDR, que é definida pela Portaria n° 33 de 13 de janeiro de 1998 como “quantidade de vitaminas, minerais e proteínas que deve ser consumida diariamente para atender às necessidades nutricionais da maior parte dos indivíduos e grupos de pessoas de uma população sadia.”, ressaltando apenas os benefícios acarretados pela utilização dos componentes da formulação do produto, num fenômeno conhecido como reificação.
A reificação se trata da exaltação dos efeitos trazidos por determinado produto em detrimento da explicação/demonstração real do que de fato é o produto, neste caso ocorre a exaltação do efeito alcançado pela utilização da BeautyBar, que é a “beleza por dentro e por fora”, em detrimento da explicação de que o produto se trata de um suplemento nutricional.
A abordagem realizada chama a atenção para o poder antioxidante presente no produto, porém ao deixar de explicar que estas quantidades contidas na barra só serão utilizadas caso o consumidor não esteja com uma alimentação balanceada ou com um déficit na absorção destes nutrientes, o fabricante omite os riscos de eliminação do excedente de nutrientes ou de uma possível hipervitaminose, por exemplo. Esta ação antioxidante citada pelo fabricante, provavelmente, remete-se as propriedades já observadas dos constituintes Vitamina C e Vitamina E (barra de frutas vermelhas), porém até que ponto pode-se dizer que a ingestão desta quantidade descrita no produto irá de fato auxiliar na proteção contra o stress oxidativo das células?!
Há ainda na propaganda a frase “contém colágeno”, também como uma chamada de marketing. Como o colágeno é uma das proteínas em maior abundância no nosso organismo, participando principalmente como constituinte estrutura, as empresas aproveitam a oportunidade para a associação da ingestão de colágeno com a manutenção de uma pele mais rígida e bela, porém também é necessário pesquisar até que ponto a quantidade de colágeno ingerida é absorvida, e quanto é utilizado para as funções que são exaltadas como efeito de sua utilização.
Há ainda outra informação na propaganda do produto que merece destaque “O inédito formato em cubos favorece uma alimentação mais equilibrada e nutritiva, e proporciona maior absorção dos nutrientes.”, porém não há comprovações científicas acerca deste assunto abordado, constituindo-se apenas em mais uma chamada de marketing para a venda do produto.

Revisão da legislação: 

Conceito novo no mercado, o termo Alimético®, batiza uma variedade de produtos e não possui uma legislação especifica. Entretanto, por possuir alegações de propriedades funcionais e de saúde em seus compostos (como redução nos níveis de colesterol, bom funcionamento do coração e atividade anticancerígena) publicados em seu website, as barras de cereais são alvo da regulação das RDC’s nº 18 e 19, de 30 de abril de 1999 as quais preconizam a regulação desse tipo de alegações, usando como base as guidelines do Codex Alimentarius CAC/GL 23-1997.

Tais RDC’s são responsáveis por descrever as diretrizes para análise e comprovação de propriedades atribuídas e descritas na rotulagem de um alimento e para registro do mesmo, onde alegações devem ser justificadas por comprovações cientificas, de forma a proteger o consumidor de uma aquisição baseada em expectativas não fundamentadas concretamente.
A RDC nº 19 preconiza que “Qualquer informação ou propriedade funcional ou de saúde de um alimento ou ingrediente veiculada, por qualquer meio de comunicação, não poderá ser diferente em seu significado daquela aprovada para constar em sua rotulagem.”. No rótulo do produto não existe descrição de propriedades funcionais ou para saúde, apenas a descrição dos nutrientes que compõem o mix de cereais. Já no site, como descrito acima, ocorre associação dos compostos com benefícios à saúde, indo de encontro à legislação.
Na RDC nº 360, de 23 de dezembro de 2003 preconiza-se obrigatoriedade de declaração de gorduras monoinsaturadas e poliinsaturadas como descreve o item 3.1.5 “Quando for realizada uma declaração de propriedades nutricionais (informação nutricional complementar) sobre o tipo e ou a quantidade de gorduras e ou ácidos graxos e ou colesterol deve ser indicada a quantidade de gorduras saturadas, trans, monoinsaturadas, poliinsaturadas e colesterol, em conformidade com o estipulado no item 3.4.6.”, porém o produto não apresenta essas informações na tabela presente no rótulo dos produtos Barra de Coco e Amêndoas e Barra de Maçã, Uva Passa e Castanhas os quais atribuem atividade para ácidos graxos poli e monoinsaturados.

Análise e Discussão:
 
Duas perguntas surgem ao abordarmos o tema aliméticos, a primeira é se eles realmente concretizam atribuições dadas ao produto e a outra se eles se caracterizam como uma nova classe de produtos ou apenas um poli-vitamínico/alimento funcional com nova roupagem. 
De forma freqüente o consumidor pode, a partir de alegações, imagens e frases de efeito presentes em embalagens, ser influenciado à aquisição de produtos com propriedades funcionais ou de saúde relacionadas à sua ingestão, dessa forma é preciso garantir por meio de comprovação científica que os efeitos prometidos são evidenciados ou se a barra trata-se apenas de mais um alimento com diversas vitaminas e sem atribuições benéficas à saúde.
Baseado na porção indicada pelo fabricante é difícil garantir que os benefícios serão efetivos ou se a opção de pagar R$ 3,99 é melhor que comprar separadamente os alimentos que compõem a formula, como maçã, uva, banana, sementes oleaginosas, mel entre outros, já que são alimentos naturais, normalmente, sem aditivos.
Para este último questionamento podemos afirmar que, de acordo com o “Guia Alimentar para a população brasileira” uma alimentação balanceada, com porções bem definidas, pode suprir perfeitamente as necessidades do organismo de uma pessoa sadia, tornando-se desnecessário a utilização de complementação alimentar com qualquer tipo de produto.

Conclusão:

Recém-nascido, o universo dos Aliméticos® promete ser um ambiente a ser explorado profundamente pelas empresas, por exemplo, Coca-Cola e Sanofi, as quais buscam explorar o mundo dos aliméticos (a partir de uma recente aliança joint-venture), lançando novos produtos no mercado para garantir receitas em alta e proveniente de diferentes âmbitos e em mercados onde essa abordagem é inexplorada até o presente momento, como o mercado europeu.  
Diante disso, é necessário que o governo estabeleça uma legislação para regulamentar essa classe, ou apenas a associe com classes já existentes, definindo-a como alimentos funcionais ou até mesmo poli-vitamínicos, de forma a evitar que apelações não comprovadas sejam utilizadas para convencer consumidores a buscar beleza sem esforço, apenas se “alimentando”.
Portanto, o sinal de alerta deve sempre estar aceso para que nós (consumidores) não sejamos vítimas do “chover no molhado” que algumas empresas “ressaltam” em suas campanhas publicitárias. Devemos sempre buscar explicações necessárias e cabíveis ao assunto, e quando estas não existirem, também devemos sair do chamado “comodismo social”, este status de “ninguém nunca fez nada para mudar, não sou eu que o farei”, porque se somos os maiores prejudicados nesta história, nós é que devemos mobilizar esforços para proporcionar mudanças benéficas e justas.

Referências Bibliográficas:

  • ANVISA – Portaria n°398 de 30/04/1999.
  • ANVISA – Resolução n°18 de 30/04/1999.
  • Ministério da Saúde - GUIA ALIMENTAR PARA A POPULAÇÃO BRASILEIRA.
  • ANVISA - Consulta Pública nº 80, de 13 de dezembro de 2004. “REGULAMENTO TÉCNICO SOBRE A INGESTÃO DIÁRIA RECOMENDADA (IDR) DE PROTEÍNA, VITAMINAS E MINERAIS.”
  • Informações Nutricionais “Beautybar” – Disponível em: < http://www.beautyin.net.br/beauty-in/>

2 comentários:

  1. As empresas que comercializam alimentos funcionais se aproveitam de palavras chaves para atrair o público numa armadilha perigosa para o consumidor, que ao ser manipulado e consumir o alimento, pode não ter o efeito esperado e desenvolver algum tipo de intoxicação, como cálculos renais por excesso de vitamina C.
    As brechas deixadas pela legislação que regulamenta o marketing destes produtos só encorajam está pratica e o prejudicado é o maior prejudicado é consumidor, que pode estar (e muitas vezes está mesmo) sendo sugestionado a comprar o produto, que muitas vezes não é barato.
    Sendo assim, o consumidor leigo é levado a comprar um determinado produto acreditando que suas necessidades, como emagrecer ou ficar mais bonito, serão sanadas ao consumi-lo, que por estar na categoria de alimentos, reforça a ideia de que nenhum maleficio pode ocorrer durante o consumo.
    É necessário um maior rigor nas punições ao desrespeito a legislação reguladora e que esta se mostre efetiva e sem brechas, protegendo a saúde do consumidor, que deve ser esclarecido desde cedo que alimentos funcionais devem ser consumidos com orientação médica ou de um nutricionista.

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  2. Visto que esse trabalho foi publicado no início do ano de 2013, podemos observar o quanto cresceu esse mercado dos Aliméticos®. Hoje podemos ver a grande diversidade desses produtos, de bebidas (beauty drink) a balas, passando por chocolates e iogurte. Tendo esses produtos todos o apelo que são saudáveis e consumi-los ajuda no rejuvenescimento. Para aprofundar um pouquinho o assinto, escolhi como exemplo o chocolate (Chocobeauty chia). A descrição do produto é a seguinte: o Chocobeauty é um chocolate ao leite com Chia sem açúcar, rico em fibras e ainda com colágeno em sua formulação. Além disso, o chocolate apresenta 26% de cacau, que possui um hormônio chamado feniletilamina, responsável por liberar endorfina, o hormônio do prazer. O Chocobeauty com Chia vem em formato de ursinho sendo o mascote da marca. Além de vir em pedacinhos, o chocobeauty é livre de conservantes. Cada porção de 25 g tem 129 calorias e equivale a 5 unidades de chocolate. Aparentemente, seria uma beleza esse produto, não? Porém, ao analisar a tabela nutricional do mesmo, podemos ver a elevada quantidade de gordura saturada (4,4 g em uma porção de 25 g, que equivale a 20% das necessidades diárias), que como já foi abordado aqui no blog, pode gerar problemas cardiovasculares. Podemos notar além disso a presença de açúcar na seção carboidratos (não diga!? o chocolate não diz ser 0% açúcar?). Por esses motivos, faz-se necessário cada vez mais a análise dos rótulos dos produtos pelos consumidores. Estes devem olhar criticamente o rótulo, a fim de não serem levados somente pela aparência e acabarem consumindo um produto que pode ser prejudicial a sua saúde. A escolha é dele. Por que se for esperar por uma legislação fiscalizadora mais efetiva e sem brechas, é melhor esperar sentado.

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